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Sobre a Música de Concerto

Se você está começando a frequentar salas de concerto, seja muito bem-vindo.
Embora não seja necessário qualquer conhecimento para apreciar a música de concerto, aqui você encontra informações básicas, dicas e curiosidades sobre este universo.




FAMÍLIA DE CORDAS
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Dois dos mais famosos compositores que criaram obras especialmente para a orquestra de cordas, durante uma das fases mais rebrilhantes do Barroco, foram Jean-Baptiste Lully (1632-1687), o músico predileto de Luís XIV, e Arcangelo Corelli, o genial articulador do Concerto grosso, destinado a vários instrumentos (de cordas, naturalmente). Nas óperas, balés, e até mesmo na música sacra, a orquestra de cordas passou a ser um elemento incontornável. Ao passar a ocupar um importante lugar na imaginação dos compositores, as orquestras de cordas jamais sairiam de moda.

 

Elas existem até hoje, com um maravilhoso repertório de obras ao seu dispor, apaixonando os seus incontáveis ouvintes. Além disso, as cordas passaram a estar na base da concepção das orquestras do Classicismo, do Romantismo, da Modernidade e da atual Pós-Modernidade. Elas têm em todas essas orquestras um papel de extraordinária importância. A família das cordas, no Barroco, era um naipe instrumental que acabara de ser levado à extrema perfeição por artesãos europeus. O nome de alguns desses primeiros mestres da sua fatura: Tieffenbruckner (Alemanha), Leonard, Wendelin e Magnu (Tirol), alguns dos quais foram trabalhar na península italiana.

 

Integram a família das cordas o violino, a viola, o violoncelo e o contrabaixo. Todos eles têm a aparência de um oito, com uma haste ou braço, além de quatro cordas que são tangidas por um arco de madeira, dotado de cerdas estiradas. Estas cerdas — naturais ou sintéticas — friccionam as cordas, fazendo-as soar. Quando ‘beliscadas’ pelos dedos do intérprete, as cordas produzem pizzicatos. Essas são as duas principais maneiras de retirar som de um instrumento de cordas. Um efeito que pode tornar o som do violino ainda mais expressivo é o vibrato, som trêmulo que os dedos do intérprete conseguem ao pressionar as cordas para cima e para baixo, de maneira sutil.

 

Durante o século XX, as orquestras baseadas na família das cordas, sendo grandes ou pequenas, inspiraram obras importantes a vários compositores. Aqui estão algumas dessas obras e seus respectivos autores: Adágio Para Cordas (1938) do americano Samuel Barber, Concerto Para Dupla Orquestra de Cordas (1938-39) do inglês Michael Tippett, Divertimento Para Orquestra de Cordas (1939) do húngaro Béla Bartók, Sinfonia Para Cordas (1940) do francês Arthur Honegger, Metamorfoses — estudo para 23 cordas solistas — (1945) do alemão Richard Strauss, Concerto em Ré (1946) do russo Igor Stravinsky, Bachianas Brasileiras nº 9 (1945) de Villa-Lobos, Trenodia em Memória das Vítimas de Hiroshima — para 52 instrumentos de cordas — (1960) do polonês Krzystof Penderecki e Ramificações (1968-69) do húngaro György Ligeti.

 

O violino é o instrumento de sons mais agudos do naipe das cordas. Suas quatro cordas são afinadas em intervalos de quintas: sol-ré-lá-mi (do grave ao agudo). Vários tipos de madeira entram na sua fabricação e mais de 80 peças diferentes são necessárias para a sua construção, muito complexa. O corpo do violino, cavidade oca, funciona como uma caixa de ressonância, onde o som produzido pelas cordas tangidas ou dedilhadas é amplificado. Ele é empunhado com a parte arredondada da caixa de ressonância presa entre o ombro e o queixo do intérprete e com o braço estirado, onde a mão esquerda do executante pressiona as cordas.

 

Foi na Itália que se concentraram os mais importantes fabricantes de violinos: Da Salò (Brescia) e Maggini (Cremona) estiveram entre seus primeiros criadores geniais. Situada no norte da Itália, a pequena cidade de Cremona imortalizaria os nomes das famílias Amati e Stradivari. Os violinos que eles criaram são considerados os mais perfeitos da história. Daí alguns exemplares sobreviventes desses instrumentos custarem hoje em dia alguns milhões de dólares cada um. Seu atual preço coloca-os fora do alcance da maioria dos violinistas, está claro. Por isso, muitos virtuoses da atualidade tocam em instrumentos que lhes são emprestados por bancos e instituições financeiras.

 

A viola tem aparência quase idêntica à do violino, já que modelada a partir dele, 15% maior. Se o som do violino pode ser comparado ao da voz de um soprano, o da viola pode ser aproximado à voz de um contralto. De timbres mais ‘escuros’, delicados e de menor projeção sonora que o violino, a viola pode ser portadora de grande expressividade. Suas quatro cordas, mais longas e grossas que as do violino também são afinadas em quintas: dó-sol-ré-lá. Assim, a corda mais grave da viola está uma quinta abaixo à da mais grave do violino (sol).

 

Bem maior, o violoncelo exige ser tocado entre os joelhos do intérprete. Um espigão sai da parte mais bojuda da sua caixa de ressonância e alcança o solo, tornando a execução do instrumento mais confortável e, também, dando a ele um maior rendimento sonoro. As cordas do cello são afinadas nos mesmos sons dos da viola — dó-sol-ré-lá —, só que uma oitava abaixo do seu registro, conferindo ao instrumento o timbre de um barítono de enorme beleza.

 

O contrabaixo é o maior e mais grave dos instrumentos da família das cordas. Em geral, tem 1,40 metros de comprimento, obrigando o seu intérprete a tocá-lo em pé, ou então, parcialmente sentado em um tamborete próprio, bem alto. Seu formato é um tanto diferente dos demais instrumentos desse naipe e suas cordas são afinadas uma oitava abaixo das do cello: mi-lá-ré-sol. Foi incorporado à orquestra durante o século XVIII . Durante o século XX, tornou-se instrumento essencial aos grupos de jazz, nos quais quase sempre é dedilhado, dispensando o arco.

 

Gravações recomendadas

Atualmente, faz especial sucesso a gravação do famoso Concerto Para Violino em Mi Menor de Mendelssohn por Tasmin Little diante da BBC Scottish Symphony Orchestra regida por Stefan Solyom (BBC Music). Em CD recente (Deutsche Grammophon), o inacabado, comovente e provocante Concerto Para Viola do húngaro Bela Bartók, obra pouco conhecida no Brasil, é executada pelo violista russo Yuri Bashmet diante da Filarmônica de Berlim regida pelo grande Pierre Boulez. Estão no mesmo disco, do mesmo autor, o Concerto Para Violino e Orquestra nº 1 (por Gidon Kremer) e o Concerto Para Dois Pianos, Percussão e Orquestra com Stefanovich, Aimard, Thomas e Percy, mais a Orquestra Sinfônica de Londres, sempre com a regência infalível de Boulez.


 
FAMÍLIA DA PERCUSSÃO
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Para fazer música, nossos remotos antepassados dos tempos das cavernas usaram, primeiro, o próprio corpo: a garganta — indo do grito ao canto —, e os pés e as mãos, para produzir o ritmo e marcar o compasso. Depois, foram buscar fora de si os elementos que ampliassem a força desses sons primordiais. Troncos ocos de árvores, pedaços de pedras e de ossos foram então batidos, chacoalhados e esfregados, a fim de chamar quem estava longe ou, então, animar quem estava por perto, em um convite para a dança cadenciada ou para uma comemoração tribal sacra ou profana. Foi graças aos materiais que coletaram na natureza que os nossos antepassados puderam começar a explorar a enorme riqueza do ritmo, do pulsar. Porque tudo pulsa: das batidas do coração à cadência do andar e do respirar, da alternância dos dias e das noites aos efeitos das marés e à sucessão das estações. Tudo pulsa, pois tudo é ritmo. Ainda hoje, em algumas comunidades da África, o ritmo é tratado com tal sofisticação — com a sobreposição simultânea de vários metros diferentes, feitos à base de vários tipos de tambores —, que esses músicos acabam por produzir uma complexa e intrincada e, para muitos de nós, ocidentais, bela polifonia rítmica. O ritmo está na base de toda música. E é o que bate com mais força nos nossos ouvidos e… (espanto!) na nossa pele — aliás, o maior órgão do nosso corpo, não é?

 

Por isso é que fica tão difícil não balançar os quadris e não sacudir as pernas à passagem de uma escola de samba. Alguns eruditos costumam dizer que o ritmo é “a organização do tempo”, levando em conta a periodicidade — regular ou irregular — dos sons. Outros estudiosos complementam: o ritmo é “a subdivisão do tempo em partes perceptíveis e mensuráveis”. Os ritmos mais comuns em nossa música são: 2/4 (1,2), 3/4 (1,2,3) e 4/4 (1,2,3,4).

 

Para produzir o ritmo de maneira evidente, os instrumentos mais indicados para isso são os da numerosa e variada família da percussão. Esse naipe existe na música do Ocidente desde a Idade Média. E, hoje, ele se espalha pela última fileira de instrumentos das modernas orquestras sinfônicas, como a Osesp. Ficam lá atrás, porque seus sons e ruídos são muito potentes; e ali eles não atrapalham os instrumentos de produção sonora mais delicada, como as cordas e as madeiras. Os sons — determinados ou não — do naipe da percussão resultam da batida, raspagem, agitação ou fricção de diferentes materiais, através de variados meios. Sua classificação tradicional é a seguinte: Membranofones — instrumentos que possuem membrana (de pele animal ou plástico) em um ou dois lados, tais como tambores, tímpanos, bombos e surdos. A caixa-clara, de dimensão relativamente pequena e também chamada de tambor militar, conta com um conjunto de cordas metálicas estiradas sobre a pele o que lhe dá um som especialmente penetrante, bem marcial. Desde o Barroco do século XVII , tornou-se um costume incluir na orquestra um par de tímpanos, que podem ser afinados. Jean-Baptiste Lully foi o primeiro a utilizá-lo, em sua ópera Thésée (1675). Bem mais tarde, no Romantismo do século XIX, os tímpanos da orquestra passaram a ser três e, no século passado, tornou-se comum ver e ouvir grupos de cinco ou seis tímpanos em uma só sinfônica.

 

Idiofones — são aqueles instrumentos que produzem sons pela vibração do próprio corpo como os pratos, a folha-de-flandres, as maracas, o pandeiro, o reco-reco e chocalhos diversos. Os pratos, de metal e em pares, podem ser batidos um contra o outro; um deles também pode ser utilizado sozinho, fixado sobre um tripé, onde é batido por uma baqueta. Os instrumentos de percussão podem produzir sons de altura determinada — como os tímbales, o carrilhão, o xilofone, o vibrafone e o jogo de timbres (Glockenspiel) —, e de altura indeterminada — como os chocalhos, tambores, pratos, pandeiros e castanholas. Durante o século XX, compositores da linha nacionalista acrescentaram à já numerosa família da percussão instrumentos provenientes da música popular e folclórica de seus países. Por outro lado, compositores mais radicais, os da chamada vanguarda, valorizaram ao máximo as possibilidades do emprego generoso da percussão.

 

Curiosidades

 

O bombo (ou bumbo) é o maior tambor do naipe da percussão orquestral: ele pode ter mais de um metro de circunferência e possui pele retesada em cada uma de suas faces. É percutido por uma baqueta que tem um pompom de algodão ou feltro na ponta. O responsável por usá-lo pela primeira vez na música clássica foi Mozart. Na ópera O Rapto do Serralho (1782), o compositor desejou dar um realce extra à música “turca” que colocou ali, com o auxílio desse tonitruante instrumento. E conseguiu um portentoso efeito…

 

Os tímbales, também chamados tímpanos, de fundos arredondados como cúpulas invertidas e que podem ser afinados, foram empregados aos pares desde o século XVIII . Haydn utilizou-os em duas de suas sinfonias, dando a eles papéis bem distintos. Na Sinfonia nº 94 em Sol Maior – A Surpresa, de 1791, os tímbales explodem, com o auxílio de toda a orquestra, depois que os violinos acabam um longo fraseado, bem baixinho, durante o movimento lento. O humorado Haydn disse ter posto nesse ponto essa espantosa timbalada a fim de acordar algum eventual dorminhoco.

 

E foi também com os tímbales — só que tratados como autênticos instrumentos solistas e sem qualquer apoio orquestral — que Beethoven deu uma força extra à sua extraordinária Nona Sinfonia (1824). Isso acontece logo no início do segundo movimento, o muito enérgico scherzo, repleto de vitalidade rítmica e de grandiosidade que beira a selvageria, a revolução.

 

Durante o Romantismo, os compositores deram asas à imaginação ao empregar a percussão em suas obras. Um dos exemplos mais curiosos dessa tendência está nos toques cristalinos do pequeno triângulo de metal, que Liszt introduziu no seu Primeiro Concerto Para Piano e Orquestra (1848). Esses toques produziram efeito hilariante na crítica mais tradicionalista da época, que imediatamente apelidou a obra de “Concerto para Triângulo”.

 

E por falar em concerto para piano, Ravel abriu o seu Concerto em Sol (para ambas as mãos do instrumentista, de 1931) com um sonoro golpe de… chicote. Como o chicote habitual poderia machucar uma parte nada desprezível dos integrantes da orquestra, o instrumento que recebe esse nome em uma sinfônica consta de duas tábuas de madeira que, batidas, produzem estalido bem semelhante ao do rebenque verdadeiro. E já que estamos em Ravel, nunca é demais lembrar que ele dá início ao arqui-famoso Bolero de 1928, com o ritmo enunciado por uma caixa-clara, o tambor militar. Durante os 17 minutos que dura essa dança obsedante, não há um segundo de descanso para ele, que toca exatamente o mesmo padrão rítmico o tempo todo. Foi no século XX que a percussão ganhou especial importância na música clássica. A desbravadora Sagração da Primavera (1913) de Igor Stravinsky inaugurou de maneira brilhante essa tendência que teria uma posteridade de altíssima qualidade, como exemplificam Ionisation (1931), partitura que Edgar Varèse concebeu para 37 instrumentos de percussão, O Mandarim Maravilhoso, Op.19 (1918-19) de Béla Bartók, Chronocbromie (1960) de Olivier Messiaen e Rituel (1974) de Pierre Boulez. O trepidante século passado foi responsável por uma autêntica novidade no domínio da música erudita: a criação de conjuntos e até mesmo de orquestras integradas apenas por instrumentos de percussão. Eles, aliados aos meios de transformação e de geração sintética de sons, parecem continuar na ordem do dia desses primeiros anos do século XXI.

 

Gravações recomendadas

 

Para ouvir O Cavaleiro da Rosa, de Richard Strauss, em casa, também sem cenários, o que torna a degustação do seu luxo sonoro eventualmente ainda mais prazeroso, pode-se recorrer à empolgante gravação feita há algumas décadas por Sir Georg Solti com a Filarmônica de Viena (Etiqueta London, em estojo de 3 CDs). Os cantores encontravam-se então no auge dos seus atributos canoros: Crespin, Jungwirth, Minton e Donath, dentre outros. E, no papel paródico mas deslumbrante do cantor italiano, ninguém menos que Pavarotti em fase áurea. E quem preferir ver uma montagem de Rosenkavalier em DVD, há uma bela versão assinada por Carlos Kleiber, na qual cantam Lott, von Otter, Bonney, Moll e Hornik. Cenários e guarda-roupas bem rococós, como os recomendados pelo libretista Hugo von Hofmannsthal (caixa de 2 DVDs da Deutsche Grammophon). Para quem gosta de fazer descobertas, uma sugestão: o CD de estreia da linda pianista russa Anna Vinnitskaya, de 26 anos, com partituras assinadas por Rachmaninov, Medtner, Prokofiev e Gubaidulina. Dona de dedos capazes de alcançar velocidades quase supersônicas, a moça também tem um coração romântico e meigo (gravação da série Ambroisie da etiqueta europeia Naïve).

FAMÍLIA DAS MADEIRAS
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Dentro do grande aparato instrumental que é a orquestra sinfônica, cada naipe é disposto de maneira que a presença de cada um de seus integrantes, assim como a sua combinação com outros, seja claramente percebida pelo regente. Os instrumentos que estão à frente do aparato sinfônico são os da família das cordas.

 

Da esquerda para a direita, espalhando-se em leque e dos mais agudos aos mais graves, tem-se geralmente: primeiros e segundos violinos, violas, violoncelos e contrabaixos. As cordas são especialmente cantantes e suas muitas ‘vozes’ podem produzir desde uma delicada filigrana quase inaudível até as portentosas declarações de amor, de ódio ou de heroísmo, entre os muitos gestos expressivos que a música costuma desvelar. Atrás das cordas há toda uma fileira reservada à família das madeiras. Esse naipe é integrado por instrumentos de sopro, de sonoridades em geral acariciantes, quase sempre empregados como solistas e capazes de proezas musicais das mais variadas. Seus principais integrantes são a flauta, o oboé, o clarinete e o fagote. E mais: cada membro dessa família dá origem a outros em várias claves e os exemplares, somados, cobrem grandes tessituras, indo do agudo ao grave, por muitas oitavas. Grupos formados por um só tipo desses instrumentos têm-nos encantado por seus resultados musicais. (Em São Paulo há um quinteto de clarinetes de alto nível, o premiado e muito criativo Sujeito a Guincho, do qual participam instrumentistas da Osesp).

 

Trinta e cinco mil anos! Isso de fato merece uma exclamação. Pois foi essa a idade dada recentemente a duas flautas encontradas em cavernas da Alemanha —uma de osso de abutre, outra do marfim retirado da bocarra de uma fera. Naquela época, o homem não só cantava como já fazia música instrumental. E caçava tigres de dente de sabre e enormes rinocerontes peludos, dando início à ocupação da atual Europa. Mais tarde, a flauta se transformaria no instrumento de Pan, deus da mitologia grega dos rebanhos e dos pastores. Bem mais perto de nós, há 2000 anos, a flauta estava com um pastor que foi um dos primeiros a visitar Jesus, na Manjedoura —contam os católicos. E, no final do século XVIII , Mozart dedicou a ela toda uma ópera extraordinária, A Flauta Mágica. (Não, não é lenda: Mozart de fato odiava a flauta, o que não o impedia de compor para ela belíssimas melodias).

 

Durante a sua bastante longa história, a flauta —basicamente um tubo ou cilindro oco dotado de pequenos orifícios— foi feita de osso, marfim, pedra, barro, cerâmica e caules de vegetais, como os dos bambus. Hoje, há centenas de exemplares diferentes seus espalhados por quase todos os povos do planeta, do Alasca à Patagônia, da Lapônia à Austrália.

 

A moderna flauta que faz parte da orquestra é bem diferente de todas as outras e é tocada transversalmente ao rosto do instrumentista — daí o seu nome: transversa ou transversal. É feita de metal e, em alguns casos, com ligas de ouro, prata ou platina. A partir do século XIX, passou a ter as chaves nelas colocadas por Theobald Böhm, garantindo-lhe maior versatilidade. As flautas mais conhecidas das orquestras são três: as denominadas flautim ou piccolo, de sons bem agudos, com a metade do tamanho das flautas habituais da orquestra; estas são as denominadas flautas soprano em Dó, que tem um alcance de três oitavas; mais graves ainda são as flautas em Sol, que soam um intervalo de quarta abaixo da flauta habitual e, para tanto, precisam ter o tubo cilíndrico curvado em forma de ‘J’. Todas elas são sopradas lateralmente, encostando-se o lábio inferior sobre uma abertura especial chamada de ‘portalábio’. Soprando o instrumento nesse orifício lateral —também chamado de embocadura, que fica próximo da parte fechada do tubo—, o executante mantém a flauta em posição horizontal, geralmente do lado direito do rosto.

 

Depois que todos os instrumentistas tomam seus lugares no palco, formando a orquestra, costumeiramente ouve-se um som (um Lá), bem agudo dado por um instrumento de sopro. É através dele que todos os integrantes da orquestra afinam seus instrumentos, a fim de dar à orquestra a necessária unanimidade sonora. Quem produz esse som é o oboé, conhecido pela precisão da altura das suas notas. O oboé é um instrumento de tubo cônico dotado de palheta dupla. (A palheta é uma fina lâmina, em geral de madeira, que vibra pela ação do ar soprado pelo instrumentista. Em certos instrumentos, como oboé e o fagote, ela é dupla, ou seja, constitui-se de um par de palhetas). Descendente de velhos instrumentos da Idade Média — como o chalumeau, a bombarda — o oboé tornou-se popular na França, em meados do século XVII , sob a designação de hautbois (literalmente, madeira alta).

 

O músico predileto de Luis XIV, Jean- Baptiste Lully, empregava oboés a fim de reforçar a sonoridade dos célebres 24 violinos do Rei. O oboé moderno tomou a sua atual configuração durante o século XIX, quando também passou a contar com o sistema de chaves de Böhm, o que deu a ele novos recursos técnicos, maior velocidade e afinação precisa. Mas, mesmo antes da adoção desse sistema de chaves, os compositores, a partir do Barroco, adoravam escrever para as suas sonoridades claras e espirituais. Entre eles encontramos Hotteterre, C.P.E. Bach, Vivaldi, Händel, Albinoni e Marcello. Dois dos mais importantes concertos que trataram o oboé como solista diante da orquestra foram assinados por Mozart e Richard Strauss. Além do oboé habitual, há outros exemplares desse instrumento como o oboe d’amore (cujo tubo tem uma espécie de bulbo ou campânula em seu final), e que soa uma terça menor abaixo do oboé comum; e o corne-inglês, que soa uma quinta abaixo do instrumento regular, tendo um timbre especialmente caloroso. O oboe da caccia, o oboé barítono e o heckelfone (ou oboé baixo) são outros exemplares desse instrumento, que aparecem só muito raramente na orquestra habitual.

 

O clarinete (ou o clarineta), na sua atual forma, foi inventado por volta de 1690, pelo alemão Johann Christoph Denner. De tubo cônico e palheta única, é feito de madeira e conta com orifícios abertos e cobertos por meio de chaves. É geralmente afinado em Si bemol ou, então, em Dó, Lá ou Ré e possui uma extensão de três oitavas. (Há milênios que ele existe em vários formatos na música popular dos mais remotos povos do Globo). Um dos antepassados ocidentais do moderno clarinete foi ressuscitado há algumas décadas —é o curioso chalumeau. Mas, na atualidade, esse termo é empregado para designar o registro mais grave e suave do instrumento da orquestra. Assim como a flauta e o oboé, o clarinete passou por notáveis modificações no século XIX, quando lhe foi incorporado o sistema de chaves de Böhm. Há clarinetes em várias tessituras, cada qual com o seu timbre peculiar. As mais agudas são as requintas, ou clarinetes em Mi bemol, e têm dimensões menores que o clarinete habitual, em Si bemol. Há também o chamado basset horn, um pouco mais grave que a normal e muito em voga no tempo de Mozart. Ainda maior e, portanto, mais grave, é o clarone, com o pavilhão recurvado como o de um saxofone, podendo lembrar, também, o formato de um cachimbo. Obras extraordinárias foram compostas para um dos vários tipos de clarinetes por Mozart, Weber, Saint-Saëns, Brahms, Reger e, no século XX, por Berg, Stravinsky e Luciano Berio, dentre outros.

 

O fagote e o contrafagote são os exemplares mais graves da família das madeiras. Ambos têm o tubo recurvado sobre si mesmo, a fim de encurtar seu comprimento (cerca de quatro metros). Assim mesmo, o tubo deve permanecer na vertical e um pequeno tubo de metal (o tudel) se encarrega de colocar a palheta dupla e o bocal ao alcance do instrumentista. No passado, quando havia muitos exemplares distintos seus, os italianos o chamavam de fagotto — literalmente, ‘feixe de varas’. Com palhetas simples ou duplas, eles descendiam do antigo curtal da Idade Média. Modernamente, restaram apenas o fagote propriamente dito, de palheta dupla e de tubo cônico, cujo registro vai do Si bemol grave até o Mi, no topo da pauta da clave de sol; e o contrafagote, afinado uma oitava abaixo do instrumento principal. Enorme, este último é tocado apoiado no chão. Como as demais madeiras, os dois tipos de fagote receberam o sistema Böhm de chaves, no século XIX. O fagote foi muito empregado pelo compositor veneziano barroco Antonio Vivaldi, que destinou a ele quase 40 concertos. A passagem moderna mais célebre entregue ao instrumento está na introdução de A Sagração da Primavera de Igor Stravinsky.

 

Gravações recomendadas

 

O compositor finlandês Jean Sibelius, até meados do século passado, era um nome que levantava opiniões contraditórias —“o pior compositor do mundo”, para René Leibowitz, o introdutor de Schoenberg na França; “o maior sinfonista desde Beethoven”, para seu biógrafo, o inglês Cecil Gray. A sua Segunda Sinfonia, a mais conhecida do ciclo sinfônico do autor, já recebeu muitas gravações respeitáveis. Uma delas é a que foi realizada pelo então muito jovem Jukka-Pekka Saraste diante da Sinfônica da Rádio Finlandesa, em São Petersburgo. (Essa gravação está em um estojo de três CDs com a integral das sinfonias do compositor para o selo Finlandia Records). Diante da fartura de boas opções, fica também o convite para duas audições: o enigmático Quarteto de Cordas de Ravel com o Juilliard Quartet (gravação Sony- Classical do início da década de 1970) e o Quinteto com Clarinete de Brahms com o clarinetista Reginald Kell e o Busch Quartet (gravação realizada no Abbey Road Studios de Londres, em 1937, existente em CD da EMI -Classics).

 

FAMÍLIA DOS METAIS
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Não se sabe exatamente de que maneira o homem descobriu a possibilidade de fundir metais — se foi por experimentação ou por puro acaso. Essa técnica complexa baseia-se na transformação de minérios — geralmente encontrados na natureza em forma de pedra, areia ou barro —, em materiais duros e, entretanto, maleáveis, passíveis de serem trabalhados de múltiplas maneiras depois de fundidos e resfriados. São os metais. Foi através dessa operação, a fundição, que esse novo material pôde ser transformado em um fantástico número de objetos destinados aos mais variados fins. É necessário lembrar que essa metamorfose exigia que a matéria-prima, retirada quase sempre de jazidas, fosse aquecida ao fogo a mais de mil e duzentos graus (no caso do minério de cobre), a fim de ser transformada: primeiro, em uma pasta incandescente, a gusa; depois, em metal resistente, quando já resfriado. E não era qualquer fogueirinha que conseguia fazer com que a matéria amorfa virasse essa lava pastosa e rebrilhante, a fim de que a fusão pudesse ocorrer, levando tal massa posteriormente a endurecer, ao esfriar. Especialistas são de opinião de que as primeiras fundições de cobre ocorreram por volta de 6 mil anos antes de Cristo, no Oriente Médio, talvez no atual Irã ou na Turquia. Depois dos utensílios feitos à base de osso, de madeira e palha, a nova idade aberta pela descoberta e exploração do metal abriu horizontes inéditos para a atuação artesanal do ser humano. Pois com esse novo material foi possível fazer jóias e adornos, um enorme número de utensílios para a casa ou para o templo. E mais: passou a ser usado para produzir armas poderosas feitas para coibir, ferir e matar. Após o cobre, foram ‘domesticados’ o bronze e o ferro. Bem mais tarde, cerca de 500 anos antes de Cristo, na China, foi a vez do aço —liga de ferro e carbono— que começou a ser usado com notável eficácia e se mostraria enormemente versátil até os nossos dias. Um aspecto bem mais pacífico da utilização dos metais pode ser observado na prática, várias vezes milenar, da fabricação de instrumentos musicais. Os metais deram uma nova e poderosa voz aos sons instrumentais, os quais passaram a soar com singular força, tendo assim um grande alcance, mesmo ao ar livre. Nos primeiros Livros da Bíblia, nas inscrições das ruínas da Mesopotâmia e nas antigas pinturas egípcias, os instrumentos feitos de metal já podem ser notados claramente. Aí citados ou representados visualmente encontram-se, sobretudo, várias formas de trompetes —os bem longos, de tubos retos, os mais curtos, de tubos recurvados—; e de trompas, também ‘retas’ ou de tubos ‘enrolados’. O som desses instrumentos nos é desconhecido. Entretanto, sabemos que ele pode não ter muito a ver com aquele apresentado nas chamadas fitas épicas da Hollywood da época dos filmes bíblicos de Cecil B. DeMille. Uma indicação segura —as referências escritas e as representações visuais acima citadas— dão-nos a certeza de que os instrumentos musicais feitos de metal logo encontraram variado emprego nas civilizações arcaicas. Sua presença era requerida em cerimônias civis, militares e religiosas. Assim, eram utilizados a fim de emprestar brilho sonoro a apelos de guerra, a desfiles religiosos ou a marchas comemorativas de vitórias militares. Isso, para não falar no domínio do mito e da lenda, onde as trombetas foram responsabilizadas ora pela queda das muralhas de Jericó, ora para sinalizar os sete anúncios dos terríveis dias do Apocalipse, segundo o apóstolo João. Os instrumentos de metal das modernas orquestras sinfônicas como os da Osesp, todos eles de sopro, ocupam a última fileira. Ficam lá no fundo, porque são os de sonoridades mais fortes e penetrantes do aparato sinfônico. Onde estão localizados, correm menos risco de encobrir os colegas localizados à sua frente, que têm emissão sonora mais fraca — as cordas e as madeiras. E na medida em que seus tubos são enrolados sobre si mesmos, não existe o perigo de baterem na nuca dos colegas da fileira da frente… Como vimos, a família dos metais descende de velhos instrumentos, alguns deles surgidos em tempos imemoriais. Outros, contudo, prendem-se ao fabrico e à utilização mais recentes. Esse é bem o caso da atual trompa que, até o século XVIII, tinha um de seus muitos exemplares empregado para anunciar tanto a chegada da diligência à estalagem quanto a descoberta de um animal que estivesse sendo caçado no campo.

 

É importante lembrar que o atual aspecto dos instrumentos da família dos metais deve muito a uma série de aperfeiçoamentos neles introduzidos, sobretudo durante o século XIX, como pistões, chaves e válvulas. Esses mecanismos tornaram a sua afinação mais justa, os seus sons menos rudes e o seu manejo menos incômodo para o instrumentista. Além disso, permitiram que os tubos metálicos fossem alongados ou encurtados, gerando, assim, sons mais graves ou agudos, dando maior amplitude à sua gama de sonoridades. Há uma enorme variedade de instrumentos de metal, muitos deles só raramente convocados a participar do arsenal sonoro das orquestras. Entretanto, todos possuem um tubo cilíndrico ou cônico, para onde o ar é soprado e passa a vibrar, produzindo o som. Também contam com embocaduras destituídas de palheta, e são soprados através de um bocal em forma de taça ou funil. No outro extremo do tubo, há uma campânula, cujo tamanho e forma variam de instrumento para instrumento e que serve para a difusão dos sons. (A forma peculiar da campânula — ou pavilhão — da trompa, no início da era das gravações, foi utilizada para ampliar o som dos antigos phonografos.) Entre esses muitos exemplares da família dos metais, há os que têm presença apenas episódica no aparato orquestral. Esse é bem o caso da chamada tuba wagneriana, do cornet à pistons francês, do clarim, do sousafone norte-americano, do bugle, do flugelhorn, do bombardão e do eufônio. Levando em conta o aspecto do tubo, esses instrumentos costumam ser divididos em três grupos: os de tubo longo e cônico (a trompa), os de tubo longo e cilíndrico (o trompete e o trombone) e os de tubo curto e cônico (a tuba). Eles são os integrantes fixos da poderosa família dos metais, de presença sempre brilhante nas grandes orquestras, onde fazem ouvir suas sonoridades suntuosas.

 

O trompete é o instrumento de som mais penetrante e argênteo da formação orquestral. Suas sonoridades são produzidas pela vibração dos lábios do executante em um bocal em forma de taça, para dentro do tubo. Três ou quatro válvulas (ou pistões) foram acrescentadas a ele, a fim de que o instrumento pudesse realizar todos os meios-tons da gama cromática, e não mais apenas os sons harmônicos naturais, dos tempos em que não contavam com esses pistões. Como os demais colegas, o trompete possui um amplo repertório que o faz ir do Renascimento à Pós-Modernidade, com sua presença sonora que ora pode ser doce, ora cintilante, ora lírica, ora altamente virtuosística. Seus timbres mais comuns são: trompete em Si bemol (o mais empregado na orquestra); trompete piccolo, que soa uma oitava acima do primeiro; e o trompete baixo, que soa uma oitava abaixo do instrumento padrão. Vivaldi, Torelli, Händel, Haydn e Hummel escreveram lindos concertos para esse instrumento.

 

A moderna trompa, que continua a ser um instrumento de execução muito difícil, tem o seu tubo cônico enrolado sobre si mesmo, a fim de economizar espaço. Ela é soprada através de um bocal em forma de taça, por onde o executante introduz o som, fazendo-o vibrar, com o auxílio da língua. Desde o século XIX, ela conta com um jogo de válvulas que ampliou o seu leque sonoro e facilitou, em parte, o seu manejo. O instrumento empregado usualmente nas orquestras também é chamado de trompa francesa, pois foi ali que ela recebeu a maior parte dos seus aperfeiçoamentos. Um exemplar bastante comum da trompa orquestral é o da chamada trompa dupla que, através de uma simples válvula de polegar, é capaz de transformar um instrumento em Fá em um em Si bemol. O seu emprego em passagens, que soam como vindas de longe, levaram alguém a chamá-la de “a alma romântica da floresta alemã”. Entre os mais notáveis concertos dedicados à trompa encontram-se os assinados por Mozart e Richard Strauss.

 

O trombone, diferentemente dos seus companheiros de família, possui uma vara telescópica para aumentar e encurtar o tubo, produzindo assim sons ora mais graves, ora mais agudos. Sonoramente, lembra algo o trompete, só que com timbre mais encorpado, na medida em que conta com uma embocadura maior e mais profunda. As posições da vara, assim como a pressão do sopro do instrumentista, permitem que o trombone execute toda a escala cromática. Os mais utilizados na orquestra, formando aí um trio, são os de timbre de tenor (em Si bemol) e o baixo (em Dó), mas também há o trombone alto, de voz emotiva, se bem tocado. Quando dotado de pistões, essas válvulas concorrem para dar maior flexibilidade à execução do trombone. Depois que Beethoven incorporou três trombones no final da sua Quinta Sinfonia, a maioria dos compositores que vieram deu algum tipo de atenção a ele.

 

A tuba produz os sons mais graves da família dos metais. Passou por várias modificações durante o século XIX, ganhando pistões, de grande valia na execução. Possui o corpo dobrado sobre si próprio, dotado de quatro a seis válvulas, e funciona pela vibração dos lábios que sopram, postos em uma embocadura em forma de taça. Fisicamente, a tuba é enorme e tem a gigantesca campânula voltada para cima. Muitos compositores modernos têm dado destaque especial a esse portento, tais como Vaughan Williams e Hindemith.

 

Gravações recomendadas

 

O Concerto para Piano de Grieg é tocado sem sotaque estrangeiro por Lilya Zilberstein, à frente da Orquestra Sinfônica de Gotemburgo, sob a regência de Neeme Järvi (CD Deutsche Grammophon). Para a Abertura Cubana de Gerswhin e outras obras coloridas, pode-se pensar em Michael Tilson Thomas (CD Sony Classical), que também assina uma sonora versão das “Danças Sinfônicas” de West Side Story, da “Suíte” de A Quiet Place e de Arias and Barcarolles, uma de suas derradeiras composições (CD Deutsche Grammophon). Para Shostakovich, as interpretações de Kirill Kondrashin são sempre recomendáveis (CD London).